O dia em que Trump “processou” Bolsonaro no interior de SP por R$ 4 mil

Um processo no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) coloca em lados opostos dois grandes aliados: o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O motivo? Uma cobrança de aluguel atrasado no valor de R$ 4.302,50. O norte-americano está como o reclamante da ação e o brasileiro, como o credor. Parece uma piada. E é quase uma mesmo.

Tudo não passou de um teste de um servidor que estava em treinamento na ocasião e aprendia a usar o sistema. O teste, no entanto, foi publicado erroneamente e permanecia no site do tribunal até ao menos essa sexta-feira (22/8), como se fosse um processo verdadeiro. Surpresos, funcionários do tribunal só descobriram o processo “fake” após o contato da coluna.

O valor da causa fictícia, de R$ 4.302,50, equivale a apenas US$ 1.112,44 na cotação do início daquele mês. Se existisse, a cifra não chegaria a ser sequer um “trocado” para Trump, a 560ª pessoa mais rica do mundo. Segundo a Forbes, o patrimônio dele é estimado em US$ 5,8 bilhões.

Esse processo “fake” consta no Foro de Salto, no interior de São Paulo. A cidade fica a 103,5 km da capital do estado e não guarda qualquer relação com Bolsonaro, muito menos com Trump.

No sistema do TJSP, não há nenhum documento – nem petição inicial, tampouco uma decisão sobre o caso – até porque a ação não passou de um “teste”. Mas o registro consta lá. A movimentação do caso informa que a distribuição dele foi cancelada em abril de 2019 – em processos reais, isso leva a Justiça a extingui-lo sem analisar o pedido.

Após encontrar o suposto processo, a coluna confirmou que o nome de Trump figurava como o autor da ação a partir do CPF dele. O republicano se registrou no Brasil em abril de 2014, conforme a Receita Federal, usando um endereço no centro da capital Rio de Janeiro.

Além de frisar a inexistência da ação, o TJSP afirmou, ainda, que fará a correção do processo no sistema:

“Esse processo não existe. Trata-se de um lançamento feito a título de treinamento, erroneamente lançado no módulo Produção ao invés do módulo Teste. Os dados lançados são absolutamente fictícios e a própria movimentação já dá conta de que se trata de um treinamento. O setor técnico responsável pelo sistema fará a correção”, informou à coluna, em nota.

Trump e família Bolsonaro

Aliados, Bolsonaro vê em Trump uma espécie de “boia de salvação” para reagir ao inquérito em que foi denunciado pelos atos antidemocráticos do 8 de janeiro. O filho dele, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), se licenciou da Câmara no fim de fevereiro para ir aos Estados Unidos articular medidas contra o Brasil.

A primeira delas foi a sanção contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito do golpe de Estado, a partir da Lei Magnitsky, em 30 de julho. Como a coluna mostrou na quarta-feira (20/8), mensagens obtidas pela Polícia Federal (PF) mostram que Eduardo sabia dessa decisão da Casa Branca duas semanas antes.

“Se você disser algo sobre EUA que não se encaixar com o que estamos fazendo aqui, pode enterrar algumas ações”, escreveu Eduardo Bolsonaro. “[A Lei] Magnitsky no Moraes está muito, muito próxima”, frisou Eduardo, também denunciado, em 15 de junho em conversa com o pai.

Trump também aplicou um “tarifaço” de 50% a produtos importados do Brasil a partir de 6 de agosto. O presidente dos EUA, no entanto, abriu quase 700 exceções, levando a medida a ser apelidada de “tarifaço light”.

Ainda nas mensagens obtidas pela PF, Eduardo escreveu ao pai que precisavam escolher entre uma “anistia light” para os manifestantes dos atos antidemocráticos do 8 de janeiro e “brecar o STF”, alvo dos bolsonaristas. A conversa se deu em 7 de julho, dia em que Trump anunciou que o “tarifaço” passaria a valer a partir de 1º de agosto, data que acabou adiada.

O objetivo do filho 03, segundo a corporação, era fazer com que o pai ficasse impune – e não defender a liberdade daqueles que participaram dos atos de 8 de janeiro. A anistia, portanto, acabou sacrificada em troca de ajuda dos Estados Unidos.

“Se a anistia light passar, a última ajuda vinda dos EUA terá sido o post do Trump. Eles não irão mais ajudar. […] Temos que decidir entre ajudar o Brasil, brecar o STF e resgatar a democracia OU enviar o pessoal que esteve num protesto que evoluiu para uma baderna para casa num semiaberto”, escreveu Eduardo.

Para a PF, Eduardo teve uma “ação consciente e voluntária” junto a autoridades norte-americanas para coagir ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), responsáveis por julgá-los.

“Ainda no dia 07.07.2025, no período da noite, EDUARDO BOLSONARO envia mensagens ao pai evidenciando que a real intenção dos investigados não seria uma anistia para os condenados pelos atos golpistas realizados no dia 08 de janeiro de 2022, mas sim, interesses pessoais, no sentido de obter uma condição de impunidade de JAIR BOLSONARO na ação penal em curso por tentativa de golpe de Estado e Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito, mediante ações de grave ameaça para coagir e restringir exercício da Suprema Corte brasileira”, escreveu a PF.

Fonte : Política Alagoana